HISTÓRIA E CULTURA

O Segredo das Sete Irmãs, a Vergonhosa História do Petróleo - Parte 5

petro topo5Enrico Mattei lançou a sua campanha de "diplomacia do petróleo". Em 1957 ele assinou um contrato com o Irã, deixando 75% dos lucros para o produtor. Foi uma bomba no quintal das Sete Irmãs. Ele virou-se depois para outros paises, incluindo Egito e Nigéria. Nico Perrone, historiador e escritor: "Mattei é visto como um pirata, com sua estratégia e as condições vantajosas que concedeu aos paises produtores de petróleo. Ele é visto como um pirata porque as principais empresas petrolíferas, nos diversos paises e no palco internacional, estavam habituadas a serem mais importantes que governos."

Mas Mattei atreveu-se a fazer o impensável: trabalhou diretamente com a URSS e reuniu-se com Gromyko. Os soviéticos concordam em fornecer grandes quantidades de petróleo a um baixo preço. Mattei abalou completamente o equilíbrio estabelecido, com essa iniciativa.

E fez acordos com a União Soviética para importações de petróleo a preços muito competitivos. Mas acima de tudo, mudou o equilíbrio do poder; um equilíbrio político e diplomático estabelecido pelos Estados Unidos e pela Inglaterra. E isso tornou-o um "alvo a abater" para as grandes potências. Estava na lista delas por causa do jogo que estava jogando, que era de uma natureza não só industrial e comercial, mas que tinha também um grande significado político. Mattei passou a estar sob vigilância dos Serviços Secretos, principalmente americanos.

No dia 27 de outubro de 1962, o avião de Enrico Mattei, um Morane Saulnier, caiu perto de Milão. Não houve sobreviventes. A investigação foi adulterada e concluiu tratar-se de um acidente devido a más condições climáticas. Quando o caso foi reaberto, em 1997, foram encontrados vestígios de explosivos nos destroços do avião. Foi um ataque deliberado. os homens por trás da trama ainda não foram identificados.

petrol reagan

 

Washington, DC, EUA. Eleito presidente em 1983, Ronald Reagan qualificou a URSS como um "império maléfico". Os programas antimíssil "Guerra nas Estrelas" visavam fornecer proteção contra uma guerra nuclear. Mas o objetivo para Washington era, acima de tudo, forçar os soviéticos a entrarem numa frenética corrida armamentista. Ronald Reagan e William Cassey, diretor da CIA, planejaram a primeira fase da armadilha. Começaram a grande caçada ao urso.

O urso é um ser assustador: o Exército Vermelho; cinco milhões de homns e armas nucleares. A vasta máquina de guerra era abastecida por dinheiro do petróleo.

François Roche, jornalista e escritor: " Para poder constantemente fazer frente ao avanço tecnológico dos EUA, o governo soviético foi obrigado a mobilizar somas de dinheiro muito significativas. E com que dinheiro financiaram os soviéticos o seu complexo de guerra militar e industrial? Com receitas de exportações de matérias-primas. Essencialmente, petróleo e gás."

petrol regan e o rei

 

A segunda parte da armadilha seria montada pelos sauditas. Reagan persuadiu o seu aliado rei Fahd a usar o petróleo como uma arma para desestabilizar a URSS. Em 1983, a Arábia Saudita abriu as comportas e inundou o mercado. Ao encorajar os sauditas a sobreproduzirem, Reagan colapsou o preço do petróleo, na década de 1980. E isso provocou um desastre em muitos países. Mas o maior efeito foi que a ex União Soviética dependia quase inteiramente de petróleo e gás para ter receitas. As fraturas internas desse regime tornaram-se buracos gigantescos e ele colapsou. O resto é história.

Através dos acordos Washington / Riade, os EUA controlavam a maior boca de petróleo do mundo; a derradeira arma estava em mãos americanas. Na década de 1980, o preço do petróleo caiu. E caiu para 13 dólares o barril. E isso provocou uma cratera na Economia Soviética. Ela ja não tinha dinheiro para se manter a tona; para pagar as pensões, para pagar aos mineiros, para comprar sabão para os mineiros, para pagar os serviços sociais que mantinham a população calada. Para comprar vodca.

O urso soviético jã não dançava. Estava de ressaca e falido. As lojas estavam vazias, os salários por pagar e anteviam-se problemas. Mikahail Gorbachev, pai da Perestroika, estava impotente. O pais estava arruinado. O preço do petróleo desmembrara definitivamente a União Soviética. Em 1989, cai o Muro de Berlim. Os Estados Balticos Geórgia e Armênia declaram a sua independência. No dia 25 de dezembro de 1991, Gorbachev demite-se do cargo de chefe de Estado. O império comunista ruiu, o urso foi esfolado.

Baku, Azerbaijão. Estou de volta ao Azerbaijão, na Costa do Mar Cáspio. Para onde quer que eu olhe na cidade, vejo uma estátua ou um retrato do ex presidente Heydar Aliyev. Ex diretor da KGB, quando a URSS ruiu, o prisidente foi o providencial salvador do novo Azerbaijão. A sua idéia era simples: olhar para o ocidente e apelar as grandes empresas petrolíferas. No dia 24 de setembro de 1994 e guiado pela BP, é assinado o maior contrato do século com outras 11 empresas petrolíferas. Sem se aperceber, o Azerbaijão entregou o seu petróleo às Sete Irmãs.

Azeri, Chirag, Guneshli...esses novos campos petrolíferos ao largo financiados pelos maiorais prometem tesouros inauditos. O presidente Heydar Aliyev e o seu filho Ilham podem regozijar-se, a sua fortuna esta feita e o seu poder bem estabelecido.

Ilham Shaban, diretor Caspian Barrel: "Com um só contrato ganhamos 24 bilhóes de dólares, em 10 anos. Em 1999 o orçamento o Azerbaijão er ja de 15 bilhóes. E tudo isso graças ao petróleo. Podem ver os resultados. Como a cidade mudou. Quando veem isso, muitos estrangeiros dizem que parece um segundo Dubai ou centro de Manhattan, com tantos arranha-céus. Foi isso que o petróleo nos trouxe e podem vê-lo."

O reverso da medalha é que o "novo Dubai" não é para todos. Quinhentos mil refugiados azeris, sobreviventes da guerra contra a vizinha Armênia, tentam sobreviver numa longa e estática viagem em carruagens abandonadas longe dos despojos do comércio do petróleo.

Após a queda da URSS, Nagorno-Karabakh, uma região do Azerbaijão com uma população maioritariamente armênia, foi envolta em agitação. Os russos distribuiram armas a ambos os lados. Mas em 1994, Baku assinou o seu lucrativo contrato com os maiorais ocidentais. Moscou ficou furiosa. Eles encorajaram os armÊnios que conquistaram a independência para Karabakh que Baku sonhara conquistar. Uma guerra vista como étnica tinha um forte odor de combustível.

Steve Levin, jornalista e escritor: "Quando a Rússia apoiou os armênios, eles deram cabo dos azeris. E parte disso tem certamente a ver com a história do petróleo. Os Azeris puseram-se atrás do ocidente. E isso obrigaotoriamente, escluiu a Rússia como interveniente no Azerbaijão. A Rússia queria demonstrar ao Azerbaijão: nada disso! Continuaremos a ser um apedra no vosso sapato e ter influência sobrew vocês. Como? O nosso aliado, a Armênia vai controlar 20% do vosso território. E foi isso que aconteceu. O contrato do século foi assinado em 1994, mas ao mesmo tempo, tinhamos uma influência contínua e imposta da Rússia por trás da Armênia através de Karabakah."

Três anos antes, em Moscou, Boris Yeltsin falou a multidão de um tanque T-72. O presidente russo deteve uma tentativa de golpe de neocomunistas. A sua função seria construir a nova Rússia liberal que as democracias ocidentais queriam.

petrol privatiza

 

Devido a falta de manutençao e fundos, a indústria petrolífera russa está num estado miserável. O novo presidente precisa de dinheiro para salvar o país da ruina. Anatoly Chubais, um ambicioso jovem ministro, forneceu a solução. A idéia era simples: privatizar as empresas petrolíferas. Acabados de sair da universidade e ainda nem com 30 anos, ja dirigiram negócios e fundaram bancos sem quaisquer medos ou dúvidas. Berezovski, Abramovich, Khodorkovsky, uma dúzia de homens que tomou as empresas privatizadas por uma bagatela.

Françoais Roche, jornalista e escritor: "Durante a década de 1990, a Rússia pertenceu aos oligarcas. Por preços totalmente ridículos, aquels jovens transformaram-se em donos de uma série de grandes mais valias petrolíferas na Rússia. Essas oligarquias encurralaram o mercado petrolífero. E houve um tal grau de osmose entre eles e a comitiva de Yeltsin no Kremlin que eram eles, basicamente, que governavam o país."

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As Sete Irmãs juntaram-se num novo El Dorado e foram recebidas de braços abertos. O petróleo russo precisava de tecnologia e investimentos e os novos jovens donos precisavam de dólares. Os campos petrolíferos da Rússia estavam á venda e os maiorais precisavam comprar.

William Ramsey, diretor do Programa IFRI: "Todos pensavam que a solução para reabilitar o setor petrolífero russo, pois estivera em dificuldades, era trazer emmpresas tecnológicas e financiamentos ocidentais. Por toda essa capacidade de gestão trabalhando e construindo o setor petrolífero russo. E, para fazer isso, foram criados esses petro-oligarcas como homõlogos das empresas ocidentais."

Estou de volta à estrada para o Cáucaso. A montanha sagrada dos armênios, Ararat, esta guardada por torres de vigia russas. O urso russo ofereceu ao país a sua proteção; um modo de vigiar o petróleo de Baku e as rotas comerciais. Preciso de gasolina para chegar à Georgia. A fonte não é importante, seja de contrabando ou não. As fronteiras aqui tem pouco importância; a Geografia da região é difinida pela "diplomacia dos oleodutos".

Para ecoar o petróleo de Baku e levá-lo paa a Turquia e a Europa, a rota mais direta passa pelo Irã; algo que os americanos recusam categoricamente. Outro projeto atravessa a Armênia; algo que o Azerbaijão recusa por estar em guerra como vizinho. A única rota possível é pelo norte e pela Geórgia. Um desvio de 600 km e milhões de dólares a mais. Foi criado o BTC - Baku, Tbilissi, Ceyhan - um oleoduto com 1774 km de comprimento, cuja construção custa quatro bilhões de dólares. É um custo aceitável para a solução energética estratégica e política, pois o petróleo do Mar Cáspio pode evitar a Rússia.

petrol putin

 

O BTC o serpenteante dragão de aço, foi inaugurado no dia 13 de julho de 2006, na presença do presidente azeri Ilham Aliyev, o georgiano Mikheil Saakasshvilli e o primeiro vizinho turco Recep Erdogan. O petróleo do Mar Cáspio evita assim a Rússia. Mas em Moscou, o poder estava mudando de mãos. Foi empossado um novo czar; um ex coronel da KGB chmado Vladimir Putin. Também ele precisava de receitas petrolíferas para financiar uma maior renovaçao russa e reforçar a sua influência internacional. Não havia como deixar o petróleo fluir para longe sem refreio.

William Ramsey, diretor do Programa IFRI: "Quando Putin se mudou para o Kremlin, percebeu que os oligarcas é que mandavam no Kremlin. E ele tratou de mudar a balança do poder. Ele tinha de encontrar alguém que pudesse usar para mostrar aos oligarcas que podiam dirigir os seus negócios e serem bilionários, mas não podiam intrometer-se na política russa. E khodorkovsky assumiu o risco."

petrol preso fachada

 

Em outubro de 2003, Mikhail Khodorkovsky, o todo poderoso presidaente da Yukos, a maior empresa petrolífera russa, foi preso. No dia 31 de maio de 2005, o jovem bilionário foi condenado a nove anos de prisão por fraude, num julgamento de fachada. Khodorkovsky teve um par de coisas contra ele. Primeiro, dizia-se que a Yukos ia aliar-se a Exxon Mobil. E Putin encarou isso como uma ameaça; não iam ter empresas ocidentais detendo posições maioritárias em empresas petrolíferas russas. Ele ia controlá-las como um estado. Putin acreditava que, para que pudesse ter os recursos de que precisava para sobreviver como presidente da Rússia, precisva de todas as recetias de petróleo e gás que pudesse acumular.

Putin: "A luz da lei, todos tem de ser iguais. seja um funcionário sem proteção, um membro do governo, um cidadão comum, um empresário em nome individual ou um grande homem de negócios, independente dos bilhóes de dólares de sua conta bancária pessoal ou empresarial."

Khodorkovsky, o inimido pessoal de Putin, voltou a ser julgado. No dia 30 de dezembro de 2010, o oligarca foi condenado a 14 anos de prisão por desfalque e lavagem de dinheiro. O petróleo russo reconquistou o seu devido lugar nos cofres do novo czar. Putin trouxe ordem, nas primeiras fases da sua retomada do Kremlin. Trouxe ordem ao petróleo e ao gás. E deixou claro que a Rússia tem demasiado interesse nessas duas comódites para deixar que sejam controlados por estrangeiros. O Kremlin quer controlá-los.

O presidente Putin pode ter restabelecido a ordem, mas o Cáucaso parece ter evitado o seu controle. Refugio-me na Tiblissi antiga, no meio das tabernas. Vodca e salada georgiana...Um momento de folga, longe das batalhas entre a águia americana e o urso russo. A capital georgiana mudou. Há um indelével odor de dólares no ar. Em 2003 a "revolução da rosa" pôs um novo e jovem presidente no poder. Mikleil Saakashvili, educado nos EUA e um aliado para Washington.

Vladimir Sokcol, cientista político: " O petróleo pôs a Georgia no mapa do mundo. Como uma mais valia geopolítica para o ocidente e como um país de trânsito vital para a energia do Cáspio. O petróleo deu ao ocidente um interesse-chave em manter a independência da Georgia e a vitalidade da Geórgia como Estado."

Manter a independência no Cáucaso é um desafio constante. É uma colcha de retalhos de minirepúblicas, estados regionais autoproblamados e conflitos étnicos. A Ossétia do Sul e a Abecássia revoltaram-se contra a Geórgia. Moscou encorajou e apoiou as suas pretensões separatistas. No dia 8 de agosto de 2008, acreditando nos EUA e talvez manipulado por Moscou, o presidente Saakashvili atacou a Ossétia do sul. Putin agarrou a oportunidade e tropas russas amontoadas junta a fronteira inflingiram uma severa derrota ao exército georgiano. O urso ursso mostrou os seus dentes.

Nikilaz Guilaouri, primeiro ministro da Gelórgia: "Se olharmos para o mapa da Eurásia, veremos que o único caminho óbvio para o petróleo e o gás do Cáspio irem pra a Europa, sem controle russo, é pelo "corredor energético" do Azerbaijão e da Geórgia. Issoé algo que não agrada muito aos homólogos russos. E é algo que eles gostariam de evitar, no futuro. E a invasão russa do ano passado também servia esse propósito. A Rússia esta tentando recuperar o seu poder da União Soviética e esse foi um dos primeiros passos dados por esse pais, no ano passado."

Deixo a Georgia e dirijo-me para a Armênia. Aqui há sempre uma mesa posta para os viajantes. Por todo o Cáucaso, a hospitalidade é uma regra de ouro. E, contudo, a guerra está presente todos os dias. Uma gigantesca manipulação. A geopolítica explora as pessoas e alimenta-se da instabilidade. Um brinde aqui é sempre para festejar a paz.

Estou no meio das montanhas da frente que separa o Karabakh armênio do Azerbaijão. O oleoduto BTC fica perto, ao alcance de uma espingarda. Os russos engendraram o conflito aqui para manterem a pressão.

Deixo Baku, no Cáucaso, pelo lado oposto do Mar Cáspio, na Ásia. Também aqui, o combate pelo petróleo prossegue. Finalmente chego a Astana, a nova capital do Cazaquistão; o Dubai ou a Manhattan das estepes. EStou dividido entre a admiração, pasmo e chacota, ante a excessiva suntuosidade orquestrada por Nursultan Nazarbayev, que governa o país coma sua família.

Mal o Cazaquistão obteve a independência, todas as grandes empresas petrolíferas do mundo, começaram a lutar para controlar os recursos petrolíferos do nosso país. Claro que as empresas americanas, aquelas a que chamamos Sete Irmãs, foram as primeiras a chegar. Depois vieram os maiorais europeus, principalmente de dois paises: Grã Bretanha e França.

Após o calapso da URSS, em 1992, as Sete Irmãs esperavam agarrar estas fabulosas reservas petrolíferas. Aconselhada por Condoleeza Rice, a Chevron mostrou às autoridades a sua generosidade. Cem milhões de dólares foram parar às contas suiças do presidente Nazarbayev. Nos primeiros anos, quando os maiorais chegaram não havia medidas anticorrupção. E circulavam boatos horríveis. Por exemplo, dizia-se que a Elf Aquitaine costumava convidar grupos de deputados para irem até a França, para mostrar-lhes como funcionavam as suas empresas e apresentar as tecnologias mais recentes. O que é normal e saudável. Mas, para além disso, colocavam os deputados em hotéis cinco estrelas e levavam-nos a superfícies comerciais e diziam-lhes: comprem o que quiserem. É por conta da casa.

Uma única estrada atravessa este vasto país cinco vezes maior que a França. As estepes estendem-se para lá o horizonte, outrora percorrido por nômadas ancestrais e cavaleiros mongóis. O presidente cazaque Nazarbayev fala em tomar o pais o quinto maior produtor de petróleo do mundo. Mas metade da população aqui não ganha nada da receita petrolífera e 1/4 não tem acesso a água potável. No meio do deserto, como oásis ameaçadores, as instalações petrolíferas substituiram as paragens de caravanas e os comboios petrolíferos transportam a sua carga pela antiga Rota da Seda.

No final do trilho está Atyrau, uma cidade que sonha tornar-se a Houston da Ásia. Peixe e caviar fizeram outrora a reputação desta pequena cidade nos limites do Império Soviético. Atualmente, é um território de caça para os conquistadores do comércio do petróleo.

Arthur Shakbrazaian, jornalista: "Se quisermos dizer que as Sete Irmãs se apoderam do petróleo no Cazaquistão, a resposta é: sim. As últimas grandes aquisições das empresas qeu podemos dizer são as sucessoras das Sete Irmãs são os campos petrolíferos de Tengiz e Kashagan, respectivamente sexto e sétimo em termos de reservas petrolíferas mundiais."

PARTE 6