HISTÓRIA E CULTURA

O Segredo das Sete Irmãs, a Vergonhosa História do Petróleo - Parte 6

petro topo6Descoberto em 2000 a norte do Cáspio, Kashagan é o maior campo petrolífero ao largo do mundo partilhado entre o Total, Shell, Exxon, Mobil e ENI. A uma profundidade de 5000 metros e envolto em enxofre e gás, é o petróleo mais inacessivel na História da produção e um enorme risco ecológico. O país não tem peritos que saibam redigir contratos e os especialistas ocidentais intepretaram tudo como quiseram. Começaram por estimar em desenvolver Kashagan, custaria 50 bilhões de dólares. Depois refizeram os cálculos e chegaram a 130 bilhões. O que é três vezes mais. Uma soma simplesmente enorme. O Cazaquistão não conseguirá pagar essas dívidas, mesmo com o petróleo. Estará pra sempre em dívida. Nunca terá lucros.

Esta manhã estou numa visita guiada e a imprensa foi convidada. Somos calorosamente recebidos na futura refinaria de Balashan. Isto aqui é uma bomba relógio. Um relatório secreto da empresa ENI afirma que, em caso de acidente, as emissões de sulforeto de hidrogênio matariam todo o pessoal, em 15 segundos. E formar-se-ia uma nuvem tóxica sobre a cidade de Atytau, em menos de 15 minutos.

Malcsat B. Idenov, primeiro vice presidente KazNunaiGas: "Estamos no século XXI. Como empresa petrolífera nacional e autoridade e também na relação com outros parceiros, grandes empresas como a Exxon-Mobil, Total, Shell, Conoco-Philips, ENI-Agip. Acredito que todas essas empresas acreditam em valores. E os valores para todos nós são: honestidade, integridade, repeito entre parceiros e igual tratamento. Esses são os valores em que acreditamos."

Inicialmente previsto para 2005 e depois adiado para 2008, o petróleo do Kashagan ainda não emergiu. O Cazaquistão já hipotecou o seu petróleo e o seu futuro. Mas as reservas até agora anunciadas, incham as previsões contabilisticas das empresas e enchem os bolsos dos seus acionistas.

Arthur Shakcarazaian, jornalista: "Mas a coisa mais perigosa é a ilusão de riqueza que o petróleo dá. Nos inícios da década de 1990, com assinatura do contrato de Tenzig, o governo explicou ao povo que Tenzig abriria muito rapidamente. Que o projeto estava em andamento e que viveríamos como no Kuwait. Quinze anos depois, o povo pergunta: O nosso Kuwait? Não ha Kuwait nenhum."

Não há uma Cidade do Kuwait, mas uma cidade americana. A cidade da Chevron, uma zona de alta segurança. Exxon, Mobil, Total e ENI tem todas enclaves bem protegidos; aldeias atrás de grades no coração da cidade. No bar Four Roses, Europa e Ásia vão tomar um copo todos os fins de semana. Hora de festa para os homnes de folga das estações e das plataformas. Para as belezas locais, é uma oportunidade para deitar a mão ao sonho petrolífero e a sua forma.

Os estados vizinhos - Azerbaijão, Rússia, Cazaquistão, Uzbequistão e irã - debatem-se pelo dominó sobre o Mar Cáspio. Para evitar a Rússia, as Sete Irmãs queriam construir um oleoduto subaquático. Os russos e os iranianos opuseram-se, sob o pretexto de preocupações ecológicas. Por isso, uma frota de petroléiros faz a ligação com o terminal em Baku.

Para a Europa e os EUA, a parada é alta. O petróleo cazaque tem de passar pelo BTC, para abastecer os mercados ocidentais. Mas, mais a oriente, um novo concorrente entrou no jogo com um apetite ilimitado. Dia 15 de dezembro de 2005. Pela primeira vez, o petróleo cazaque flui para o império imóvel. Do Mar Cáspio até a China, um gigantesco oleoduto liga os campos petrolíferos cazaques e Xinjiang, uma provincia muçulmana de fala turca que se revolta contra a repressão de Pequim.

Michael Klare, professor e escritor: "A China está interessada no petróleo do Cazaquistão. Porque? Porque é o único grande fornecedor que faz fronteira com a China que pode entregar petróleo por rotas petrolíferas terrestres. Para a liderança chinesa e de um ponto de vista estratégico e de segurança energética, isso é tremendamente valioso. Ela não depende de petróleo que vem por mar. Todo o petróleo que vá por mar pode ser interditado pela Marinha dos EUA. "

O novo oleoduto fornece quase 15% dos requisitos petrolíferos da China às refinarias na região de Uyghur. Pequim considera estrategicamente vitais as reservas petrolíferas da Asia Central. Dai ser tremendamente importante que a província de Xinjiang esteja sob o firme controle de Pequim; não pode permitir que seja uma zona instável. E, por isso, a liderança chinesa encara a instabilidade em Xinjiang - a insurgência muçulmana dos uyghurs - como uma grande ameaça a sua segurança nacional. Urumqi é a capital da região autonoma de Xinjiang Uyghur.

Motins aqui provocam a morte de centenas de vítimas: hans, da China, e uyghurs, uma minoria na sua própria província. A repressão imposta por Pequim é implacável. Xinjiang tem de permanecer sob o controle da capital imperial: as necessidades energéticas da China exigem-no.

Jean Radvansy, Diretor INALCO: "Esta situação nem os americanos previram. Nem americanos nem russos a tinham previsto. Isto significa que não existe apenas a disputa entre EUA e Rússia, no Cáucaso. Há trÊs jogadores em jogo. Os russos no norte, os americanos controlando a maioria dos projetos no sul e os chineses a leste, que estão intervindo de forma cada vez mais massiva e que, sem dúvida, ampliarão ainda mais a sua influÊncia."

Um vasto jogo de xadrez, jogado pelo Cáucaso fora e pela Ásia Central. Neste novo jogo do petróleo, EUA, Rússia e China disputam o controle das reservas de combustíveis fósseis da ex URSS e rotas de abastecimento. Um jogo a três - com o mundo como espectador - entre trÊs ferozes animais: a águia americana, o urso russo e o dragão chinês.


Tempo de Mentiras


Sigo a costa sudoeste da Irlanda, ao longo da N71. Tenho um encontro marcado com Colin Campbell a quem todos chamam de "Sr Pico do Petróleo". Um geologista que trabalhou com todas as grandes empresas petrolíferas. O homem que previu o fim do petróleo.

"Prevejo o fim do mundo e há quem me descreva como mercador do Juizo Final. E isso é uma realidade, pois acabei por me aperceber que o mundo moderno funciona a petróleo. Não estamos falando do fim do petróleo, mas do fim da produção, pois o último barril a ser descoberto e produzido pode ainda demorar muito tempo. O que enfrentamos agora é o pico do petróleo. Na minha perspectiva, o pico do que chamo convencional, do produto fácil, foi em 2005. E penso que o pico de todas as categorias, incluindo águas profundas e petróelos pesados, foi ano passado (2010)."

Port Arthur, Texas, USA. A moaior refinaria domundo com a alcunha "Beco do Inferno". Quando não há brisa marinha, o ar aqui é irrespirável. O petróleo que é queimado e transformado aqui vem de todos os continentes. Petroleiros atravessaram todos os oceanos, para satisfazer o apetite dos EUA por ouro negro. 250 milhões de automóveis esperam pelos seus abastecimentos. É o preço do modo de vida americano.

Mario Sanoya, professor da Universidade Central, Venezuela: "As Sete Irmãs formam um grandioso cartel ou, podíamos dizer, uma máfia internacional, que secretamente controla o petróleo em muitos paises produtores. Na verdade, elas não só partilham os lucros do petróleo como partilham o controle do mundo.

Ballydehob, Irlanda. Por entre os pubs e casas coloridas da aldeia irlandesa de Ballybehob, Colin Campbell vivem uma tranquila aposentadoria. Como líder da Associação do Estudo do Pido do Petróleo, Colin não se preocupa com a existência do pico do petróleo, mas quando acontecerá. É uma realidade que o mundo se recusa a aceitar. Mas como Colin me relembra, um barril de petróleo é como um barril de cerveja: quanto mais depressa o bebermos, mais depressa se acaba.

Colin Campbell: "Não há dúvida que um declínio do petróleo fará com que os que tem um agrande porção, maioritariamente o Oriente Médio, sofram uma maior pressão da China, doa EUA, da Europa, em menor grau, e de outros paises para o produzirem. Mas poderão estar sob pressão para produzirem e sob pressão militar."

petrol cavalo

 

Midland, Texas, EUA. Até onde o olhar alcança por entre os campos de algodão, 300 mil cavalos de balanço abanam a cabeça, bombeando o sangue da economia americana, ha mais de 100 anos. Uma imagem arquétipo de gerações. No Texas dos cowboys e da boa carne, o petróleo é um religião, um estilo de vida todo poderoso na criação e destruição de fortunas. Diz-se aqu que existem duas maldições: comunismo e impostos. Nesta terra de livre iniciativa, não há impostos sobre rendimentos e todos são donos do solo e recursos sob a sua propriedade.

Há três mil plataformas petrolíferas, no Golfo do México. E, nas planicies texanas, mais de mil poços ativos. Muitas empresas são familiares. Esta manhã tenho um encontro com Doug Robinson, um nascido e criado homem do petróleo.

"Sendo petróleo de terceira geração, depois do meu avô e do meu pai, temos o negócio do petróleo no sangue. Gostamos do risco da indústria do petróleo e do gás. E há quem tenha ficado muitíssimo rico e muitíssimo pobre, muitas vezes. É uma parte da lenda do Texas ocidental."

De volta a estrada, dirijo-me para Midland, a ciade natal de George W Bush. Os Bush são uma dinastia na qual o petróleo se mistura com a política. O avô, o senador Prescott, fez dua fortuna a frente de um banco que apoiou o esforço de guerra nazista. Ele aconselhou os filhos: façam-se ricos e metam-se na política. O seu filho George enriqueceu com o petróleo e tornou-se presidente dos EUA. O seu neto George W. perdeu uma fortuna no petróleo, mas tornou-se presidente dos EUA.

É sábado a noite. Música e álcool na baixa Midland. Junto-me a festa. Agricultores e homens do petróelo festejam as últimas flutuações no preço do petróleo. Falido no sábado, rico na segunda-feira. O petróleo é dispendioso de produzir nos EUA e os políticos estão obrigados a proteger os pequenos investidores. É uma equação simples: sem leis de proteção ecológica e preços altos, o petróleo americano pode ser rentável. Todos os presidentes americanos sabem disso e os homens do petróleo sempre lhes financiaram as campanhas.

O Texas é uma terra patriótica. Se um aguera tem de ser travada contra terroristas ou para proteger campos petrolíferos no estrangeiro, eles estão lá.

Douglass C. Robison : " Estou a repetir-me, mas o petróleo é estratégico. Temos de tê-lo. E, se não o tivermos, as pessoas que não o tem virão roubá-lo de nós. É como comida. Se nao tivermos comida, seremos obrigados a ir arranja-la."

Basra, Iraque. O Shatt al-Arab é o estuário onde o Tigre encontra o Eufrates. Esta manhã, estou numa lancha da South Oil Company, a caminho de um terminal ao largo, em Bassorah. Somos abordados por uma patrulha americana. Ningém se aproxima do terminal, sem autorização. Até o meu colegaq passageiro, um iraquiano e diretor da South Oil, tem de obedecer.

90% do petróleo iraquiano passa por Bassarah. O terminal é de vital importância e a sua proteção é uma prioridade máxima. A missão está confiada à Força de Intervenção 158. Para os empregados iraquianos, é a maior das humilhações. O petróleo iraquiano está sob controle americano. O seus deuses e as suas preces não mudarão nada.

Ali Nasser, diretor do termina pretrolífero Al Bakr: "Não concordo com o que se passa. Quero o controle entregue unicamente aos iraquianos. Gostaria que as forças ocupantes saissem do Iraque, rapidamente. É o que todos os iraquianos querem. Durante a era de Saddam, fomos castigados...duas vezes ! Enquanto ele estava vivo e depois da sua morte. Enquanto ele estava vivo, sofremos as suas injustiças. E, depois da sua morte, os americanos."

Deixo os petroléiros americanos enchendo-se com petróleo iraquiano e pego a estrada para Bagdá. A cidade vive a paz americana no caos. Explodem bombas diariamente, mas não esta claro quem é o inimigo. As patrulhas são iraquianas. Os uniformes e as armas são fornecidos pelos EUA. Os americanos se deslocam de helicoptero. Tenho um encontro marcado com um ex ministro do petróleo e atual conselheiro do presidente.

Thamir A. Ghadbhan, ex ministro do petróleo: "Se virmos todo o Iraque, é um pais rico em petróleo por toda a parte. A título informativo e sendo eu um homem do petróleo, apesar do Iraque ter sido um dos primeiros produtores de petróleo da região, é o menos explorado. Certo? Se perfurássemos 100 poços no Iraque, 73 poços obteriam petróleo. É essa a experiência histórica. Há tanto petróleo na região do Curdistão e começam a surgir novas descobertas que não me surpreendem em nada."

Iraque, Curdistão. A estrada para o norte em direção às montanhas do Curdistão iraquiano. Terra de pastores durante muito tempo governada e dominada por Bagdá, o Curdistão descobriu uma possível riqueza petrolífera e sonhos de independência. Um pesadelo para o regime centralizado de Bagdá. Em 2007, o parlamento curdo aprovou uma nova lei petrolífera que concedia às autoridades do Curdistão a liberdade para controlarem licenças e expórtações, sem consulta Bagdá.

Há festa em Arbil, a capital do Curdistão iraquiano. O presidente iraquiano Jalal Talabani e o líder do Curdistão Massoud Barzani abrem o fluxo do petróleo curdo. No dia 1 de junho de 2009, o Curdistão juntou-se às fileiras dos países exportadores de petróleo. Com uma bandeira, um exército, um hino nacional e um idioma. O Curdistão está pronto para se tornar um país.

Desde a retirada das tropas americanas, tem havido batalhas diárias entre curdos, xiitas e sunitas. O Curdistão sonha em retomar a sua antiga capital: Kirkouk. Mas ela é rica em petróleo, muito rica. E Bagdá não tem intenção de abrir mão dela. Em outubro de 2009, Bagdá fechou as torneiras do petróleo curdo. O petróleo produzido no Curdistão tinha de fluir por oleodutos iraquianos. As receitas petrolíferas seriam centralizadas em Bagdá e o Curdistão receberia 17% do rendimento estatal. A questão de partilhar o dinheiro do petróleo tornou-se um motivo possível para uma guerra civil.

Na situação atual, existem talvez uns 28 contratos que foram outorgados pela rgião fderal do Curdistão a empresas petrolíferas, sem coordenação como governo federal e com o Iraque. E, claro, que isso originou fricções entre o Ministério do Petróleo e o Ministério de Recursos Naturais do Curdistão. Um dos pontos que realmente incomoda os homens do petróleo, os reguladores e Bagdá, é que esses contratos não foram outorgados dentro do espírito do acordo, aceite no projeto-lei. "

Duzentos mil Peshmerga, "aqueles que enfrentam a morte", garantem a segurança da região. A nova riqueza e a provável autonomia da região são a causa de preocupação entre os paises vizinhos, todos com substanciais comunidades curdas: Turquia, Síria e Irã. O petróleo poderá trazer riquezas, mas também rivalidades e ressentimento.

Aram Ismall Saced, diretor de informação KNN-TV: "Produzir petróleo pode fortalecer os curdos e permitir-lhes criar um futuro risonho para a região do Curdistão. E esse futuro irá, sem dúvida, também influenciar a Síria, o Irã e a Turquia. É por isso que não é só o Iraque que se opôem a esse papel. Os paises vizinhos também não querem que os curdos tenham e produzam petróleo e se beneficiem das receitas."

Os Mulás no Irã estão atentos à fricção entre os curdos e Bagdá. A guerra na região liderada polos americanos deu a Teerã um considerável potencial par criar problemas. Uma influência politica na região que, para muitos, significa que qualquer presidente em Bagdá tem de ter a benção do Irã. Uma vez mais, os EUA abriram outra caixa de pandora e esta com dificuldades para fechá-la.

Como Bagdá bloqueia as exportações de petróleo do Crudistão, as caravanas de petróleo refinado dirigem-se para o vizinho Irã. Um vasto e estranho fluxo de tráfego e o petróleo do Curdistão iraquiano passa ao lado de Bagdá. Isolado por um embargo imposto pelos EUA, o Irã tem falta de refinarias e tem de importar uma parte considerável de seu combustível. Um paradoxo absurdo para o terceiro maior produtor de petróleo do mundo.

PARTE 7