Daniel Paul Tammet (nascido Daniel Paul Corney, Londres, 31 de Janeiro de 1979) é um savantista britânico (autista-prodígio altamente-funcional) que possui uma grande facilidade com matemática e aprendizado de línguas. É o primeiro filho de uma família com 9 crianças, cujos pais são operários em Londres. Em sua memória, Born on a Blue Day, ele fala sobre como o fato de ter epilepsia, sinestesia e savantismo afetou profundamente sua infância. A síndrome do sábio confere a Daniel Tammet capacidades especiais na memorização de números e grande facilidade na aprendizagem de línguas. Ele foi capaz de dizer 22.514 dígitos de Pi e de aprender a falar islandês em uma semana.
Atualmente fala onze línguas diferentes, além de ter criado seu próprio idioma, o Mänti. Daniel Tammet ganhou a mídia ao quebrar o recorde europeu de memorização e recitação de pi, nas comemorações do dia do pi do Museu de História da Ciência de Oxford, em 14 de março de 2004. Daniel recitou os 22.514 dígitos corretamente em cinco horas, nove minutos e 24 segundos. Os fundos arrecadados neste dia foram doados a instituições que tratam de pessoas com epilepsia, mal que acometeu Tammet na infância.
O que torna Tammet único entre os portadores de savantismo é que ele consegue explicar para os cientistas o que se passa em sua mente. Ele diz que em sua mente cada número inteiro até 10.000 possui uma forma, textura e cor únicas, e utiliza essa capacidade para realizar cálculos matemáticos. Daniel desenhou como ele vê os primeiros vinte dígitos de pi para o programa 60 minutes. Uma prévia pode ser encontrada na seção de artes de seu site oficial. Segundo o próprio Daniel afirmou no Late Show with David Latterman de 27 de abril de 2005, alguns cientistas estão estudando seus processos mentais para tentar repeti-los em indivíduos "normais".
Em 2005, foi rodado o documentário Brainman: The boy with incredible brain (algo como: "Homem-cérebro: o garoto com um cérebro inacreditável"), a respeito da vida e das habilidades de Daniel Tammet (um trocadilho com o título de Rain Man, filme que popularizou a figura do idiota-prodígio). Escreveu os livros "Born on a Blue Day" (Nascido num dia azul, cor que representa, para ele, as quartas-feiras, dia da semana em que nasceu)ISBN 978-972-8929-72-5 e "Embracing the wide sky: A tour accross the horizons of mind" (Abraçando o imenso céu: Uma viagem através dos horizontes da mente, ainda sem edição em português), em que analisa suas habilidades à luz de estudos científicos. Atualmente, ensina idiomas segundo seu próprio método, pelo site Optimnem.
NASCIDO EM UM DIA AZUL
Por dentro da mente de um autista extraordinário - Daniel Tammet teve uma infância extremamente isolada, que ele preencheu com números. Estes não eram meras convenções, como as dos livros escolares de matemática, mas entidades quase oníricas, dotadas de cores, formas, texturas e movimentos. Devido a uma rara mistura neurológica de sentidos chamada sinestesia pelos cientistas, o 1 parecia-lhe, por exemplo, branco e brilhante. Outros números eram simplesmente tímidos. De qualquer forma constituíam-se nos melhores amigos de um garoto incomum, que somente aos 25 anos descobriu ter a síndrome de savant, mais especificamente a síndrome de Asperger, uma forma de autismo relativamente branda.
Apesar da intimidade com os números em geral, sobretudo os primos, justamente pelo isolamento destes em relação ao outros, Daniel teve de aprender a decodificar, por exemplo, as emoções. Os sentimentos escapavam ao seu raciocínio lógico. Assim, as outras crianças não pertenciam à sua solidão. Enquanto os irmãos corriam pelo parque, ele permanecia sentado no chão, fixado numa trilha de joaninhas ou nas microscópicas linhas da palma da mão. Quando bebê, não balançava o corpo como outros autistas, mas chorava, gritava e batia fortemente com a cabeça na parede. Sua forma de autismo era então desconhecida e por isso passou despercebida.
Nascido em um dia azul é o relato corajoso e otimista de um universo particular diferente, nem por isso aterrador ou sombrio. Pelo contrário, é descrito como um mundo lírico, povoado por imagens e cores. Ou por ficções: aos 11 anos, Daniel passava o tempo criando figuras históricas muito próprias, como presidentes e primeiros-ministros, com suas respectivas biografias. Embora admita ter de beber chá no mesmo horário todos os dias e ser compelido a outros tantos ritos repetitivos diariamente, o autor circula com desenvoltura entre os universos, o seu e o externo, contando essa aventura com agradável acento poético.
Formato(s) de venda: livro, e-book
Tradução: Ivo Korytowski
Páginas: 192
Gênero: Ficção
Formato: 16 x 23 cm
ISBN: 978-85-98078-27-4
Lançamento: 06/11/2007
A inteligência sem fim dos autistas savants
Por Reinaldo José Lopes, 01/03/2019 - Eles podem aprender uma língua nova em uma semana, decorar 10 mil livros, e criar uma nova matemática. Conheça os poderes dessas mentes extraordinárias. Kim Peek conseguia ler um livro de 300 páginas em 40 minutos. Uma página com cada olho. Quando ele morreu, em 2009, aos 58 anos, já tinha lido 9 mil livros, o que dá mais ou menos um a cada dois dias desde a infância. E com uma diferença em relação a você: ele jamais esqueceu uma palavra. Kim sabia de cor a história de todos os países, seus presidentes, quando eles nasceram, quem foram as esposas deles… Recitava qualquer trecho da Bíblia, do Alcorão ou da estrutura de um ônibus espacial.
E tudo isso é pouco perto do que o britânico Daniel Tammet faz. Ele simplesmente inventou uma matemática particular. Pergunte para Daniel quanto é, digamos, 27 elevado à 5ª potência. Ele vai responder rapidinho que isso dá 10.460.353.203. Só que sem ter feito uma conta nem decorado nada. Os resultados surgem por mágica na cabeça desse inglês tímido de 38 anos. E ele não é incrível só com números. A rede americana de TV PBS o desafiou a aprender islandês, uma língua que até quem nasceu na Islândia acha complicada, em uma semana. Sete dias depois, Daniel estava num talk show em Reykjavik contando que o idioma deles era “mjög fallegur” (“muito bonito”) – era a 11a das línguas que ele aprendia a falar fluentemente.
Além disso, Daniel é autista. Kim Peek também era. Kim mal conseguia falar, não sabia abotoar a camisa e, quando criança, tinham lhe recomendado internação para o resto da vida. Já Daniel é comunicativo, um rapaz bem simpático até, mas se sente perturbado quando anda em ruas movimentadas e é tão desligado que não consegue pegar um ônibus sem se perder. Isso de combinar algum problema mental com brilhantismo, ou até genialidade, em certas áreas, é conhecido como síndrome de savant (“sábio”, em francês), uma condição raríssima que desafia as idéias sobre como a mente funciona.
Afinal, ninguém deveria ser capaz de decorar com precisão a quantidade de informações que os savants (vamos chamá-los assim, daqui para a frente) conseguem acessar sem o menor esforço em seus “discos rígidos” cerebrais. Também não parece fazer sentido a maneira como muitos deles lidam com a matemática: fazer contas gigantes é, para eles, uma atividade não consciente, como andar de bicicleta. E se pessoas com inteligência e habilidades sociais normais aprendessem como fazer isso? Será que todo mundo tem um “savant adormecido” dentro do próprio cérebro? É o que veremos a seguir.
Sábios
A primeira descrição que temos do savantismo foi feita em 1887 por John Langdon Down, psiquiatra britânico mais conhecido por ter feito também o primeiro relato científico sobre a síndrome de Down. Uma das principais experiências de Down com savants envolveu um paciente que conseguia recitar de cabeça o livro O Declínio e Queda do Império Romano, um catatau de 6 volumes. Down batizou os portadores do problema de “idiotas savants” (calma, na época “idiota” era um termo técnico).
Alguma forma extraordinária de memorização parece estar por trás de todos os casos de savantismo, mas é bom qualificar essa afirmação: trata-se de uma memória diferente da que você usaria para decorar um número de telefone, por exemplo. Parece envolver pouco pensamento consciente e, muitas vezes, nem exige compreensão do que está sendo decorado. Darold Treffert, psiquiatra da Universidade de Wisconsin em Madison (EUA), relata o caso de dois gêmeos americanos com dano cerebral congênito, George e Charles, que não conseguiam fazer contas de somar simples, mas se divertiam gritando um para o outro números primos (os que só são divisíveis por 1 e por eles mesmos) de 20 dígitos, da ordem de quintilhões. Em comparação, a sua memória só consegue lidar com 7 ou 8 algarismos. É inconcebível fazer operações mentais conscientes com números desse tamanho.
George e Charles, assim como Kim Peek e vários outros savants, também eram calculadores de calendário. Se você dissesse a Peek em que dia do mês e ano nasceu, ele responderia imediatamente com o dia da semana em que você veio ao mundo.
O preço que se paga para ser um savant é alto. Em geral, esses indivíduos são 10% dos autistas, ou uma a cada 2 mil pessoas que sofreram algum dano no cérebro ou nasceram com retardo mental. Uma grande exceção é justamente Daniel Tammet, diagnosticado com síndrome de Asperger, uma forma moderada de autismo – o portador tem boa capacidade verbal, embora normalmente seja um desastre social.
Além de ser um savant, Tammet também tem sinestesia, uma forma rara de percepção que faz o cérebro misturar sentidos – sons podem ter cores associadas a eles, por exemplo. E isso torna a mente do rapaz ainda mais fascinante. A sinestesia dele é numérica. Ele afirma que todos os números de 0 a 10 mil possuem formas visuais específicas e até personalidades, como se fossem indivíduos mesmo. “O 11 é amigável, o 5 é barulhento e o 4 é meu número favorito, porque é quieto e tímido como eu”, conta Tammet em sua autobiografia.
O britânico também reconhece todos os números primos até 9 973 porque eles lhe parecem “redondos e lisos, como os seixos numa praia”. Ao fazer multiplicações enormes, seu tipo favorito de contas, Tammet visualiza as tais formas dos números que estão sendo multiplicados lado a lado, separados por um espaço. Essa brecha entre os números tem exatamente o formato do produto da multiplicação: basta ele preenchê-la para que ele saiba, em poucos segundos, a resposta certa. Veja:
CÁLCULO SAVANT
Daniel Tammet foi o primeiro savant que conseguiu descrever como sua mente faz cálculos sobre-humanos sem fazer força. Veja como. (E nem pense em tentar você mesmo!)
1) Pensando em 3D
Tammet imaginou formas para todos os números entre 0 e 10 mil. Cada um ganhou identidade própria. Algo mais ou menos assim:
2) Imaginando quem se encaixa
Para multiplicar, ele aproxima mentalmente os “números” e deduz como preencher o espaço entre eles:
3) Pronto!
Então Tammet lembra que forma tem o número que se encaixa melhor no espaço vago. E encontra a resposta certa:
Bizarro. Mas, ao que parece, Tammet realemente pensa desse jeito. O neurocientista Vilayanur Ramachandran, do Centro de Estudos do Cérebro de San Diego, testou as formas numéricas de Tammet, pedindo que ele as moldasse usando massinha de modelar e, no dia seguinte, que as refizesse. O resultado foi consistente, ou seja, o rapaz associa sempre a mesma forma ao mesmo número. O inesperado nas capacidades de Tammet é que as pessoas normais tendem a pensar nos números como abstrações puras, enquanto ele os transformou em objetos altamente concretos, coisas tão fáceis de entender intuitivamente quanto um cachorro ou um gato. Esse pode ser um segredo da inteligência savant, de acordo com Darold Treffert. A memória que mais usamos para atividades intelectuais é a consciente, que nos ajuda a lembrar se “espaço” se escreve com s ou cê-cedilha. Mas há outro tipo importantíssimo de memória: a implícita – aquela que nos permite trocar as marchas do carro sem pensar.
Você pode ser um savant
Ao que parece, os danos mentais que os savants têm os deixam sem acesso a grande parte da memória consciente. Então seu cérebro simplesmente transfere as funções dela para a implícita. E eles fazem automaticamente coisas que temos de pensar (e muito) para fazer. É uma capacidade não muito diferente de reconhecer um rosto. Nós nunca precisamos de uma descrição verbal da cara de um amigo para determinar que ele é o Paulo, e não o José: nosso cérebro simplesmente sabe. Para Tammet, os números funcionam assim. E talvez você seja mais parecido com ele do que imagina.
É o que pensa o neurologista Allan Snyder, da Universidade de Sydney. Para ele, existe um Daniel Tammet dentro da sua cabeça. Esse “savant interior”, segundo o autraliano, foi quem fez você aprender a falar. Se você se mudar para a islândia e tiver um filho lá, terá uma criança bilíngüe em casa. Ela vai aprender português em casa e islandês na escola, e falar os dois idiomas. Você pode até aprender a língua local, mas nunca terá a fluência do seu filho.
Essa habilidade mágica de “sugar” um idioma existe apenas na infância porque a mente vai “calejando” com o tempo. Por exemplo: Qem lê um txto scrito dste jto consegue entender a frase porque o cérebro criou padrões para cada uma dessas palavras. Com os sons de um idioma estranho é o contrário: sua mente está tão calejada com o português que decifrar novas línguas de ouvido não é fácil. Já os savants não teriam esse problema. Para Snyder, os danos físicos no cérebro deles impedem que esses calos mentais apareçam. Daí a capacidade de aprender islandês em uma semana.
E a coisa mais maluca aqui é que Snyder quer fazer com que esse savant que um dia esteve na sua cabeça apareça de novo para dar um oi. Como? Aplicando ímãs no crânio. A idéia é “desligar” temporariamente partes da massa cinzenta a fim de simular os danos que os savants têm no cérebro. E assim fazer com que você veja o mundo como se fosse um deles. E não é que deu certo? Snyder fez com que pessoas submetidas ao experimento “virassem savants” por algum tempo, desenhando de forma mais precisa ou encontrando com mais facilidade erros de digitação que o cérebro das pessoas normais costuma ignorar. E o australiano vai mais longe. Ele acredita que novas versões de experiências como essas poderiam despertar a criatividade de gente comum. Afinal, por alguns minutos, poderíamos absorver informações em estado bruto, sem o filtro dos padrões mentais. Aí seria possível usar isso para desafiar idéias preconcebidas e inovar.
Como, aliás, inovaram dois savants famosos: Isaac Newton e Albert Einstein. Não, não existe prova nenhuma de que eles portavam essa condição. Mas alguns neurologistas acham que os dois apresentavam, sim, pelo menos alguns sintomas da síndrome de Asperger – principalmente inabilidade social e obsessões compulsivas. De fato, Newton mal abria a boca e ficava imerso no trabalho a ponto de não comer. E Einstein, que se comportava como um autista até os 7 anos, repetindo frases sem parar, era tão desligado que certa vez não percebeu um terremoto enquanto divagava. Talvez nunca saibamos se eles eram ou não versões moderadas de Daniel Tammet. Mas Einstein pode ter deixado uma pista: “Uso sinais, imagens mais ou menos claras, como ferramentas para pensar. Elas se encaixam sozinhas, voluntariamente. Esse jogo de combinações me parece mais essencial que construções lógicas com palavras”. Foi o que disse certa vez o alemão. Qualquer semelhança disso com o que você leu nesta reportagem talvez não seja mera coincidência.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/
https://www.intrinseca.com.br/
https://super.abril.com.br/