À medida que o grande dia da coroação de Charles se aproxima (2023), o Reino Unido não perdeu a chance de adicionar uma camada curiosa ao evento: um convite ao povo britânico para jurar lealdade ao rei Charles III. Isso mesmo, agora você pode oficialmente declarar-se "fiel e obediente" ao novo monarca. Alguns aplaudem a ideia, achando um charme essa homenagem pública. Outros, claro, veem a coisa toda com uma sobrancelha erguida.
Para muitos, essa "homenagem do povo" lembra um eco dos tempos medievais, onde os súditos se curvavam em submissão aos seus reis. Mas, sejamos sinceros, nos dias de hoje, não estamos todos um pouco cansados de viver sob a sombra de "fidelidades" e "obediências"? Imagine jurar lealdade a um "nobre" que carrega o peso de escândalos, laços questionáveis e uma fortuna que, para muitos, simboliza o privilégio e a distância da realidade comum. E, ainda assim, lá estão os discursos grandiosos de figuras públicas, como Shabana Mahmood, dizendo que esse ato seria "encantador", e Mark Harper, descrevendo o juramento como uma "oportunidade fantástica" para os britânicos mostrarem ao mundo sua devoção.
Mas será que essa lealdade tem o valor que parece? A proposta de Harper é que o ato servirá de vitrine para o Reino Unido. Quem conhece um pouco da história colonial britânica pode ver a ironia por trás disso. O Reino Unido já foi uma das maiores potências coloniais, e o conceito de "submissão" tem, no mínimo, um histórico sombrio.
O arcebispo de Westminster também elogiou a ideia, chamando-a de um momento "notável", onde o povo, pela primeira vez na história, pode participar ativamente da coroação. Mas, em vez de ser um reflexo de conexão com o público, muitos percebem o movimento como um pedido disfarçado de submissão. Afinal, lealdade, nesse contexto, não soa muito como uma troca justa. Como dizem os britânicos, soa mais como um "raquete de proteção": você jura obediência, e o Estado, em troca, promete proteção. E se essa "proteção" vier com um alto preço de fidelidade cega?
Para os que enxergam esse cenário com olhos críticos, o convite à lealdade soa mais como uma peça de teatro do que uma verdadeira conexão com o povo. Quem quer se comprometer com um rei que, ao longo de sua vida, cultivou amizades e associações que até hoje são questionadas? Entre os amigos próximos de Charles estavam figuras controversas como Jimmy Savile, cujos crimes foram amplamente divulgados. Mesmo diante de acusações, Charles manteve uma conexão com ele, bem como com o bispo Peter Ball, acusado de abuso. O rei, à época, chegou a comprar uma propriedade para Ball, minimizando a gravidade das acusações.
Há quem diga que o novo monarca apenas estava mal assessorado, cercado por um séquito que não o orientava adequadamente. E, por mais ingênuo que Charles possa parecer, é difícil não se perguntar: até que ponto essa ingenuidade é real? Talvez, como sugere a tradição, os conselheiros ao redor do monarca não se importaram em avisá-lo dos perigos de tais amizades.
Então, aqui estamos, com um convite que muitos já sabem onde querem enfiar. A imagem de britânicos abanando bandeiras com um sorriso no rosto pode ser até tentadora, mas, para muitos, aceitar esse "convite" é um exagero. Afinal, Charles não é o primeiro — nem será o último — a ocupar o trono com um histórico que provoca mais dúvidas do que admiração.
Para os que veem isso como uma brincadeira de mau gosto, talvez seja um bom momento para refletir sobre o papel de juramentos e lealdades em pleno século XXI. Um rei que vem de uma linhagem de escândalos, sempre com uma nova promessa de renovação, mas com raízes que se agarram firmemente aos valores do passado. Quer você deseje se unir a Charles ou apenas observar o espetáculo de longe, a coroação será, sem dúvida, um marco peculiar. Afinal, há quem prefira seguir um caminho alternativo, não como súditos de um rei, mas como cidadãos de um mundo onde a verdadeira lealdade talvez seja a si mesmo e ao futuro.