Alimentos e hegemonia: a estratégia oculta para dominar nações pobres

Alimentos e hegemonia: a estratégia oculta para dominar nações pobres

Por que será que, mesmo com alimentos suficientes no mundo, tantas pessoas ainda passam fome? Será apenas uma questão de má distribuição ou há algo mais sombrio por trás disso?

Imagine um cenário onde a comida não é mais um direito básico, mas uma arma geopolítica. Parece exagero? Bem, talvez não seja. Nos últimos anos, especialmente desde o início da crise na Ucrânia em 2022, temos assistido a uma escalada alarmante nos preços dos alimentos e fertilizantes, afetando diretamente os mais pobres ao redor do globo. Mas aqui vai o detalhe: não estamos falando de escassez . Na verdade, segundo especialistas, há comida suficiente para todos. Então, qual é o problema?

A "Tempestade Perfeita" de Guterres

Em março de 2022, o secretário-geral da ONU, António Guterres, lançou um alerta que ecoou como um trovão: "Um furacão de fome e um colapso do sistema alimentar global está se formando." Ele estava se referindo às consequências devastadoras das interrupções nas cadeias de suprimentos causadas pela guerra na Ucrânia. Preços de alimentos, combustíveis e fertilizantes dispararam, e os mais vulneráveis estão pagando o preço mais alto.

Mas espere um pouco... Se existe comida suficiente no mundo, por que as pessoas estão morrendo de fome? Aqui entra o grande elefante na sala: a especulação financeira e o controle corporativo sobre o sistema alimentar global.

O Jogo Geopolítico por Trás da Fome

A guerra na Ucrânia não é apenas uma disputa territorial; ela é, acima de tudo, um tabuleiro estratégico onde os EUA jogam suas cartas para manter sua hegemonia global. Segundo o economista Michael Hudson, essa guerra é, na verdade, contra a Europa – especificamente contra a Alemanha. O objetivo? Impedir que a Europa fortaleça seus laços comerciais e energéticos com a Rússia e a China.

As sanções impostas à Rússia não foram um tiro no escuro. Elas foram cuidadosamente planejadas para dividir o mundo em dois blocos: de um lado, os EUA e seus aliados europeus; do outro, a Rússia e a China. E quem paga o pato? Os países mais pobres do Sul Global, que agora enfrentam preços estratosféricos de alimentos e energia.

Isso não é novidade. Desde os anos 1970, os EUA têm usado crises semelhantes para consolidar seu poder. Lembra da crise do petróleo de 1973? Henry Kissinger, então secretário de Estado dos EUA, manipulou eventos no Oriente Médio para aumentar os preços do petróleo e garantir lucros astronômicos para as gigantes petrolíferas americanas. Ao mesmo tempo, ele impôs um sistema de dependência econômica que afundou muitos países africanos em dívidas inescapáveis.

A Estratégia do Agronegócio e a Revolução Verde

Se você acha que isso é só sobre petróleo, pense de novo. O controle da agricultura global também faz parte desse jogo. Durante décadas, o Banco Mundial incentivou países em desenvolvimento a abandonarem a agricultura local para cultivar commodities de exportação, como soja e milho. Essa estratégia, conhecida como a Revolução Verde , transformou muitas nações autossuficientes em dependentes de importações alimentares.

Hoje, empresas como Cargill, Archer Daniel Midland e Bunge dominam o mercado global de alimentos. Para elas, "segurança alimentar" não significa garantir que todos tenham acesso à comida; significa garantir que todos tenham dinheiro para comprá-la. Isso cria um ciclo vicioso: os países precisam de dólares para comprar alimentos e petróleo, então focam na produção de commodities de exportação, deixando suas populações à mercê de flutuações de mercado.

Crise por Design

O relatório "Semeando Fome, Colhendo Lucros" da Navdanya Internacional revela como leis internacionais de comércio e acordos como o Acordo sobre Agricultura (AoA) da OMC favorecem os interesses do agronegócio global. Enquanto pequenos agricultores são esmagados pelas flutuações do mercado, gigantes corporativos continuam lucrando bilhões.

E aqui está o ponto crucial: essa crise foi projetada. As políticas neoliberais implementadas desde os anos 1980 enfraqueceram as economias locais e criaram uma dependência quase insustentável de commodities globais. Agora, com a guerra na Ucrânia e as sanções à Rússia, os EUA estão usando essa crise para reforçar sua influência sobre o Sul Global, impedindo que esses países se alinhem com a China ou a Rússia.

O Futuro é Hoje

Enquanto isso, milhões de pessoas estão sendo empurradas para a pobreza extrema. Países africanos, por exemplo, estão sendo forçados a adotar medidas de austeridade para pagar dívidas crescentes, cortando gastos públicos essenciais como saúde e educação. Tudo isso para continuar comprando alimentos e combustíveis caros.

Mas nem tudo está perdido. Movimentos sociais e organizações como a Oxfam estão denunciando essas práticas predatórias e defendendo alternativas baseadas na soberania alimentar. Afinal, a solução para a fome não está em mais mercados globais ou monoculturas industriais, mas sim em sistemas alimentares locais, sustentáveis e justos.

Conclusão: Quem Controla o Alimento Controla o Mundo

Não há dúvidas de que o sistema alimentar global está sendo manipulado para servir aos interesses de poucos em detrimento de muitos. Mas a pergunta que fica é: até quando vamos aceitar isso?

A próxima vez que você ouvir falar de uma crise alimentar, lembre-se: não é falta de comida, é falta de justiça.