215 Crianças Enterradas em Segredo no Canadá

215 Crianças Enterradas em Segredo no Canadá

"215 Crianças. Nenhuma Cruz. Nenhum Nome. Só um Campo de Silêncio no Canadá." Você já parou pra pensar que, em pleno século 21, o mundo ainda descobre valas comuns com corpos de crianças enterradas como lixo? Não é filme de terror. Não é distopia. Aconteceu em 2021, no Canadá — aquele país que a gente vê nos comerciais, todo limpo, civilizado, com direitos humanos no papel e bandeira de urso polar.

Só que por trás dessa fachada de bondade, existe uma ferida aberta, podre, que a terra resolveu expor: 215 crianças indígenas, enterradas em segredo, sem registro, sem nome, sem direito ao luto. E o pior? Ninguém se surpreendeu de verdade. Quem sabia, sabia. Quem sofreu, sempre soube. E quem fingiu que não via… bem, agora tem que olhar.

O Radar Achou o Que a História Tentou Apagar

Foi em maio de 2021. O sol batia no solo seco perto de Kamloops, no interior da Colúmbia Britânica. Um time de técnicos manuseava um radar de penetração no solo — aquele aparelho que vê o que está enterrado sem cavar. Parecia cena de arqueologia. Mas ali não era Egito. Era Canadá. E o que estava debaixo da terra não era tesouro. Era morte. Em poucos dias, os dados foram cruzados. Os sinais eram claros: 215 anomalias no subsolo. Cada uma, um corpo. Cada uma, uma criança. A chefe da Primeira Nação Tk’emlúps te Secwépemc, Rosanne Casimir, anunciou a descoberta com a voz firme, mas o coração em pedaços:

“Lamentavelmente, sabemos que muitas outras crianças estão desaparecidas.”

Não foi um achado aleatório. Foi um ato de justiça. As comunidades indígenas vinham falando disso há décadas. Sobreviventes contavam histórias de colegas que sumiram do nada. Professores que desapareciam com um saco de lona à noite. Crianças que adoeciam e nunca mais eram vistas. Mas ninguém ouvia. Até que a tecnologia provou o que a memória coletiva já sabia: o Canadá enterrou seu passado — literalmente.

Kamloops: O Maior Campo de Assimilação Forçada do País

A Kamloops Indian Residential School não era só uma escola. Era uma máquina de destruição cultural. Funcionou de 1890 a 1969, administrada primeiro pela Igreja Católica, depois pelo governo. Chegou a abrigar 500 crianças ao mesmo tempo, vindas de comunidades indígenas a centenas de quilômetros de distância. As crianças eram arrancadas das famílias. Às vezes, por força. Às vezes, com ameaça de prisão aos pais. Eram levadas para um lugar onde seu nome era trocado por um número, sua língua era proibida, seu cabelo era cortado, sua fé era apagada.

“Era política do nosso governo ‘acabar com o indígena’ na criança.”

— Perry Bellegarde, ex-chefe nacional da Assembleia das Primeiras Nações.

E isso não é metáfora. É documento. É relatório. É história oficial. Entre 1874 e 1996, o Canadá operou 139 escolas internas como essa. Mais de 150 mil crianças indígenas passaram por elas. Eram alunos das Primeiras Nações, Métis e Inuit — povos que habitam o território há milênios, mas que, para o Estado, eram “problemas a serem resolvidos”.

Genocídio Cultural: O Que o Governo Chamou de “Educação”

Em 2015, a Comissão da Verdade e Reconciliação (TRC) entregou um relatório de 4 mil páginas. O título? Genocídio cultural. Sim. A palavra é essa. Não é exagero. Não é hiperbole. É o termo técnico usado pela ONU quando uma cultura é sistematicamente destruída. O relatório mostra:

Crianças com fome, dormindo em camas infestadas de piolho.
Doenças como tuberculose se espalhando como rastilho de pólvora.
Professores e padres que abusavam sexualmente dos alunos — e eram protegidos.
Alunos punidos por falar sua língua nativa — às vezes com chicotadas, tapas, ou ficando dias sem comer.

E o pior? O governo sabia. Sabia das condições. Sabia das mortes. Sabia que as taxas de mortalidade nas escolas eram cinco vezes maiores que entre crianças não indígenas na década de 1940. E mesmo assim, cortava verba. Priorizava economia em vez de vida.

“Temos registros de escolas discutindo com o governo sobre quem pagaria os funerais dos alunos.”
— Stephanie Scott, diretora-executiva do Centro Nacional para a Verdade e Reconciliação.

Imagine só: uma criança morre. Em vez de chamar a família, os administradores abrem uma planilha: “Quanto custa enterrar?”

Quantas Crianças Morreram? A Conta Nunca Fecha

Em 2015, a TRC estimou que 6 mil crianças morreram nos internatos. Até hoje, só 4.100 foram identificadas. Onde estão as outras? Enterradas em valas comuns? Jogadas em poços? Queimadas em fornalhas? Sobreviventes contam coisas que parecem pesadelo:

Bebês nascidos de abusos por padres, tirados das mães e jogados em fornos.
Crianças que fugiam e eram caçadas como animais.
Alunos que morriam de frio, fome, ou pancadas, e eram enterrados atrás do refeitório.

Murray Sinclair, presidente da TRC, disse algo que arrepia:

“Sabemos que há muitos locais como Kamloops. E precisamos nos preparar para isso.”

E ele tem razão. Depois de Kamloops, outras descobertas pipocaram:

751 corpos em Marieval, Saskatchewan.
600+ em Kuper Island.
Dezenas em outras escolas.

E isso só com radar. E só nos lugares que estão sendo investigados. O total pode ser muito, muito maior.

Igreja Católica: A Única Que Ainda Não Pediu Desculpas

Das 139 escolas, a Igreja Católica administrava 70%. Os outros 30% eram de igrejas anglicanas, unidas e presbiterianas. E adivinha quem ainda não pediu desculpas oficialmente? A Igreja Católica.
As outras três igrejas já se desculparam nas décadas de 80 e 90. Já a Católica? Silêncio. Um silêncio que pesa mais que uma cruz de pedra. O Papa Francisco já foi pressionado por sobreviventes, líderes indígenas e até pelo primeiro-ministro Justin Trudeau. Em 2017, Trudeau foi até o Vaticano pedir um pedido de desculpas. O Papa ouviu. E depois? Nada.

Só em 2022, após pressão global, o Papa finalmente visitou o Canadá e pediu “perdão” — mas não um pedido formal da Igreja, nem reconheceu o genocídio. Foi um discurso com cuidado cirúrgico, como se escolhesse cada palavra pra não assumir responsabilidade.

“Um pedido de desculpas da Igreja Católica seria curativo. Faz parte do fechamento dessa ferida.”
— Perry Bellegarde.

Mas feridas assim não fecham com palavras. Fecham com verdade, justiça e reparação. O Que o Governo Fez? Pouco. Muito Pouco. Em 2015, a TRC lançou 94 chamados à ação. Entre eles:

Investigar todos os cemitérios de escolas.
Devolver terras.
Garantir educação indígena.
Pedidos de desculpas oficiais.

Em 2024, quantos foram cumpridos? Apenas 10. Dos 94, só uma mão cheia foi feita. O resto? Em andamento. Parado. Esquecido. O governo prometeu 33,8 milhões de dólares para mapear os cemitérios. Até hoje, o Centro Nacional para a Verdade e Reconciliação recebeu só uma parte. Trudeau diz que está “chocado”. Fala em “ações concretas”. Mas ações concretas não são discursos. São verbas. São investigações. São justiça criminal contra quem cometeu abusos e foi impune. E o mais absurdo? Essas escolas funcionaram até 1996. A última fechou no ano em que o Brasil ganhou a Copa do Mundo. Isso não é história antiga. É história viva. São avós, pais, tios que ainda carregam as cicatrizes.

E Agora? O Que Fazer Com Tanta Verdade Enterrada?

O que fazer com 215 corpos? Com milhares de histórias apagadas? Com uma nação que se vangloria de ser “justa” enquanto enterra seu passado? A resposta não é simples. Mas começa com verdade. Investigar todos os 139 locais. Identificar os corpos. Devolver às famílias. Julgar os responsáveis — enquanto ainda há sobreviventes. Reescrever a história nas escolas. E, acima de tudo: ouvir quem sempre foi ignorado. Porque o pior não foi o que fizeram com as crianças. O pior foi o que fizeram com a memória. O pior foi o silêncio. O pior foi fingir que nada aconteceu.

O Silêncio Também Mata

Você já viu um memorial improvisado? Em frente a catedrais, no meio de parques, em frente a antigos prédios de escolas. Milhares de sapatinhos de criança. Brinquedos. Fotos. Velas. São gritos em forma de silêncio. Porque cada sapato representa uma vida que não teve infância. Uma língua que não foi falada. Um nome que foi apagado. E o mais triste? Isso não é só no Canadá. É na Austrália. É nos EUA. É em países onde povos originários foram tratados como “atrasados”, “selvagens”, “problemas”. Mas o Canadá teve a coragem — ou a vergonha — de escavar. De olhar pra dentro da terra e dizer: “Isso foi feito em nosso nome.”

Agora a pergunta é: o que vamos fazer com essa verdade? Porque verdade sem justiça é só um ferimento aberto. E justiça sem memória é esquecimento disfarçado de paz.

Conclusão: A Terra Não Esquece

As crianças de Kamloops não morreram em vão. Elas morreram em silêncio. Mas agora, a terra está falando por elas. E o que ela diz é claro: Nada foi apagado. Nada foi perdoado. Nada foi resolvido. A história não acabou. E enquanto houver uma vala sem abrir, um nome sem ser lembrado, um sobrevivente sem ser ouvido — essa história vai continuar.

E talvez, só talvez, ao ler isso, você não consiga esquecer. E talvez, ao fechar a tela, sinta um peso no peito. Não é culpa. É responsabilidade. Porque verdades assim não podem ser enterradas de novo. Nem por governos. Nem por igrejas. Nem pelo tempo. Se você chegou até aqui, parabéns. Você não só leu. Você testemunhou. E isso, por si só, já é um começo.