Imagine ser enterrado vivo. O frio da terra comprimindo seu corpo, a escuridão absoluta ao seu redor, o ar rarefeito tornando cada respiração uma luta desesperada. Para a maioria, isso é apenas um pesadelo distante, mas para Marjorie McCall, foi uma realidade tão aterrorizante quanto inacreditável. Essa história, que atravessou séculos, mistura lenda e verdade de uma forma que até hoje intriga historiadores e viajantes que visitam seu túmulo na Irlanda.
Uma Vida Comum em Tempos Difíceis
Nos turbulentos anos 1700, a Irlanda era uma terra de fome e doença, onde a morte rondava cada esquina como um espectro impiedoso. Foi nesse cenário que viveu Marjorie McCall, uma mulher humilde que morava em Lurgan, casada com um médico chamado John McCall. Sua vida era comum, sem riquezas ou feitos grandiosos, mas o destino a preparava para algo que a tornaria imortal nas lendas do povo irlandês.
Marjorie adoeceu de febre alta, uma condenação quase certa na época. Com os conhecimentos médicos limitados, seu marido não conseguiu salvá-la. Adoeceu rápida e gravemente, sendo declarada morta em 1705. Por medo da propagação da doença, foi sepultada apressadamente no cemitério da Igreja de Shankill. Mas sua história estava apenas começando.
O Anel que Despertou a Ambição
Embora Marjorie não fosse rica, carregava no dedo um anel de ouro de grande valor. E onde há ouro, há cobiça. O problema era que seu dedo, inchado pela morte, não permitia que a joia fosse retirada. Assim, seu corpo foi enterrado com o anel ainda em seu lugar.
Não demorou para que a história chegasse aos ouvidos dos "ressurreicionistas" — ladrões de túmulos que vendiam corpos às universidades de medicina e a outros interessados. Para eles, Marjorie era um prêmio duplo: o valioso anel e um cadáver fresco pronto para ser negociado.
A Noite Macabra e o Despertar do Túmulo
Na calada da noite, os ladrões cavaram furiosamente até alcançar o caixão de Marjorie. Ao abrir a túmpa, lá estava ela, aparentemente inerte, com seu anel ainda brilhando ao luar.
Tentaram arrancá-lo sem sucesso. O dedo não cedia. A solução foi brutal: um deles puxou uma faca e, sem hesitar, começou a cortar. Mas assim que a lâmina feriu sua carne, algo impensável aconteceu.
Marjorie abriu os olhos.
Não apenas isso: ela sentou-se dentro do caixão, olhou para o próprio dedo ensanguentado e soltou um grito que perfurou a noite como um trovão. Os ladrões, apavorados, largaram tudo e correram como se tivessem visto um fantasma. Dizem que alguns morreram ali mesmo, de puro choque.
Mas Marjorie não ficou no túmulo. Como um pesadelo que escapa de um sónho, ela rastejou para fora do caixão e seguiu pelas ruas de Lurgan em direção à sua casa.
O Pavor da Cidade e o Destino do Marido
Imagine a cena: uma mulher, que todos acreditavam estar morta, caminhando na noite silenciosa, vestida com trapos de enterro, coberta de terra e sangue. Os poucos que a viram fugiram em pânico, trancando portas e janelas, convencidos de que tinham testemunhado um fantasma.
Ela continuou, silenciosa e determinada, até sua casa. Quando chegou, bateu à porta. Seu marido, John, ainda de luto, ouviu e, sem saber quem era, disse: "Se minha esposa estivesse viva, eu juraria que era ela batendo." Ao abrir a porta e se deparar com Marjorie, viva e respirando, seu coração não aguentou. Ele caiu morto ali mesmo, fulminado pelo choque.
Uma Segunda Vida e a Lenda que Permanece
Com o marido morto e uma segunda chance de viver, Marjorie seguiu adiante. Casou-se novamente, teve filhos e viveu por muitos anos, desta vez morrendo de fato e sendo enterrada novamente — agora, definitivamente.
Sua lápide no Cemitério de Shankill carrega uma inscrição que intriga visitantes até hoje: "Vivida Uma Vez, Enterrada Duas Vezes".
Lenda ou Realidade?
A veracidade dessa história continua a ser debatida. Céticos apontam a falta de registros concretos, sugerindo que tudo não passa de folclore. No entanto, historiadores como Jim Conway argumentam que os registros da época eram caóticos devido à fome e às guerras, e que Marjorie pode muito bem ter sido real. A existência de múltiplas Marjorie McCalls nos arquivos oficiais apenas aumenta o mistério.
O que sabemos com certeza é que sua lápide ainda está lá, atraindo turistas e curiosos, e que algumas testemunhas juram ter visto seu espírito vagando pelo cemitério à noite.
Seja verdade ou mito, uma coisa é certa: a história de Marjorie McCall é uma daquelas que nunca será enterrada — pelo menos, não para sempre.