Os Colossos de Memnon, essas impressionantes estátuas de pedra, são como sentinelas que resistiram ao tempo, erguidas na necrópole da antiga cidade de Tebas, hoje localizada na margem oeste do Nilo, em frente à moderna Luxor. Ali, a cerca de 680 quilômetros ao sul do Cairo, onde um dia se ergueu a capital do Antigo Egito, essas figuras imensas, com cerca de 18 metros de altura e pesando mais de 700 toneladas cada uma, continuam a fascinar. Representando o faraó Amenófis III, que governou há cerca de 3.400 anos, as estátuas serviam de guardiãs à entrada do que seria o templo mortuário do grande governante.
Um Olhar para o Passado
Quando nos aproximamos dessas estátuas colossais, sentimos como se estivéssemos olhando para a própria face da eternidade. Elas estão sentadas, com as mãos repousando nos joelhos, o olhar fixo para o leste, em direção ao Nilo. Não é apenas o tamanho que impressiona, mas o que simbolizam. Ao lado do faraó, nas laterais das pernas, estão esculpidas figuras de sua mãe, Mutemuia, e de sua esposa, a rainha Tié, como se as três gerações de poder estivessem perpetuamente conectadas.
Mas há um detalhe ainda mais curioso: nos dois lados do trono, encontra-se o sema-taui, o símbolo da união entre o Alto e o Baixo Egito, algo que Amenófis III prezava profundamente. O deus Hapi, a figura mitológica responsável pela fertilidade do Nilo, é retratado unindo as duas plantas heráldicas, o papiro e o lírio. É quase como se a própria estátua dissesse: “Aqui, sob meu reinado, Egito era um só.”
Transportando o Impossível
A história dessas estátuas não seria completa sem mencionar o inacreditável feito de engenharia para sua criação. As pedras usadas para esculpi-las vieram da pedreira de Gebel el-Ahmar, “a montanha vermelha”, localizada ao nordeste do Cairo. Imagine só: esses blocos gigantes foram transportados por mais de 600 quilômetros até Tebas! Como? Não pelo Nilo, mas por terra. Incrível, né? Um trabalho liderado por Amenófis, filho de Hapu, o arquiteto do faraó. Esse é um daqueles momentos da história em que a realidade parece mais fantástica do que qualquer ficção.
O Silêncio dos Gigantes
Originalmente, essas estátuas guardavam a entrada de um templo memorial, construído para glorificar Amenófis em vida e na morte. Esse templo, de proporções gigantescas, ocupava cerca de 385 mil metros quadrados, o maior e mais opulento de todo o Antigo Egito. Mas o tempo foi implacável. Inundações constantes do Nilo danificaram sua fundação, e com o passar dos séculos, outros faraós desmontaram grande parte do templo para usarem as pedras em suas próprias construções.
No entanto, os Colossos permaneceram. E com o passar dos anos, o colosso norte, após um terremoto devastador em 27 a.C., ganhou uma nova fama: ele "cantava". Sim, ao amanhecer, logo após os primeiros raios do sol tocarem sua superfície, o gigante emitia um som misterioso. Estrabão, um historiador grego que visitou o local em 20 a.C., descreveu o som como "um sopro ou um assobio", enquanto Pausanias, outro viajante grego, o comparou ao estalo de uma corda de cítara se rompendo.
O Canto de Memnon
Por que o colosso cantava? A ciência moderna acredita que a causa era a evaporação da umidade acumulada durante a noite, que ao se dissipar com o calor do sol, produzia um som semelhante a um gemido. No entanto, na Antiguidade, o fenômeno foi envolto em mitos. Os gregos, sempre prontos para dar uma explicação mitológica para o inexplicável, ligaram a estátua ao herói Memnon, filho da deusa Eos, a deusa do amanhecer. Morto na Guerra de Troia, Memnon teria recebido a imortalidade de Zeus e, todas as manhãs, chamava por sua mãe com o nascer do sol. Daí o nome "Colossos de Memnon".
Curiosamente, em 199 d.C., o imperador romano Septímio Severo ordenou a restauração da estátua, mas, ironicamente, após a reconstrução, o colosso nunca mais cantou. É como se, ao tentar reparar o que o tempo havia feito, os romanos tivessem silenciado para sempre o espírito que habitava o gigante.
Depredações e Destino
Infelizmente, a passagem dos séculos não foi gentil com os Colossos. Eles foram alvo de vandalismo, especialmente durante os primeiros séculos da era cristã. Muitos cristãos acreditavam que os sons misteriosos eram obra do “diabo” e, em nome da fé, depredaram as estátuas. Muçulmanos, posteriormente, também contribuíram para a destruição, deixando o colosso norte em pedaços.
Hoje, esses gigantes de pedra continuam de pé, silenciosos, mas com uma história rica e cheia de simbolismos. Mesmo após terremotos, inundações e a mão destrutiva dos homens, os Colossos de Memnon permanecem, como uma metáfora viva da resistência, da memória e do poder.
Curiosidades Finais
Se você for visitar o Egito, não se surpreenda ao ver turistas ainda encantados com essas figuras imponentes, imaginando como seria ouvir o “canto” de Memnon ao nascer do sol. E, quem sabe, se você fechar os olhos, possa até ouvir, no fundo de sua mente, o som que, por séculos, fascinou romanos, gregos e egípcios.
Esses colossos, mesmo em silêncio, ainda falam ao coração daqueles que estão dispostos a ouvir o eco da história.